terça-feira, 10 de julho de 2012

Então, Diana, o que é que um engenheiro químico faz mesmo?

Engenheiro Químico - a que será que se destina?
George Davis 1850-1907
Se houvesse algum tipo de pesquisa do IBGE que desse estatísticas sobre o conhecimento das pessoas a respeito do trabalho de um engenheiro químico sou capaz de apostar que teríamos algo perto de 98% de total desconhecimento do que faz esse profissional. Não digo isso para criticar ninguém, longe de mim. Eu mesma, quando prestei vestibular, sabia muito pouco sobre o que faria quando me formasse. O mesmo posso dizer dos meus calouros, da minha família... Mas como estudante do ramo, não posso deixar de fazer a minha parte pra mudar isso.


Lewis Norton


A engenharia química é uma profissão recente. Pelo que se sabe George Davis, um britânico, que era inspetor de segurança para o "Alkali Act, 1863" (primeira peça de legislação ambiental conhecida), foi o primeiro a identificar a necessidade de uma nova profissão em ligação com a indústria química, em franca expansão nos finais do século XIX. Até então, os técnicos encarregados da supervisão ou projeto dos processos nas indústria eram ou engenheiros mecânicos com conhecimentos do processo químico, ou químicos (industriais) com larga experiência industriais e conhecimentos de processo. Desse modo, químicos com instinto para engenharia e engenheiros com gosto pela química deram origem aos engenheiros químicos.
Primeira edição do
primeiro livro sobre
engenharia química.

Davis, num conjunto de 12 aulas proferidas na Manchester Technical School identificou e definiu os fundamentos de um novo grupo de profissionais que designou por "Engenheiros Químicos". Àquela época, a ideia foi mal aceita pela comunidade universitária e pela dos profissionais de engenharia; o mesmo aconteceu à sua tentativa de criar a Society for Chemical Engineers, no Reino Unido.

Somente em 1888, nos EUA, no MIT (Massachussets Institute of Technology), nasceu oficialmente a Engenharia Química a partir da proposta de Lewis Norton.

O curso foi chamado "Course X" e seu primeiro graduado (1891) foi William Page Bryant. O primeiro livro com a temática Engenharia Química foi escrito por Davis em 1901 e foi editado no MIT.

Na Europa, o primeiro país a criar o curso foi Portugal, em 1911; na Inglaterra isso ocorreu por volta de 1920; e na Alemanha em 1945.

Mais informações sobre a história podem ser encontradas aqui, aqui e aqui.

Quais são as bases desse curso superior?


Suas bases estão nos conhecimentos de fenômenos de transporte (a grosso modo: análise de energia relacionada ao movimento, transferência de calor e transferência de massa), os quais dependem dos conhecimentos de cálculo, cálculo numérico, solução de equações diferenciais ordinárias e parciais, termodinâmica e outros. Através dos FTs, aprende-se as Operações Unitárias, cujo objetivo é o mais simples e óbvio de todos: controlar processos industriais e fazer mais com menos. Otimizar, como ouvimos vinte vezes por dia na universidade. E lidar com alguns problemas sempre caso eles ocorram.


No português prático e simples: matemática, física e química aplicadas diretamente aos funcionamento industrial.

Como assim, Diana?

Vou tentar explicar do jeito mais simples possível. Usando o conhecimento que tenho depois de quase quatro anos de estudo. Teorizar aqui não vai adiantar, então vamos à prática.

Peneira Industrial
Pense em algum processo industrial. Suponhamos: peneiramento. O açúcar 'tá pronto, agora vamos peneirar pra garantir que os cristais estejam em uma mesma faixa de tamanho - sim, a legislação exige. Isso é uma operação unitária, uma das mais simples. O engenheiro químico faz as contas e diz: qual deve ser a vibração da peneira, qual a massa de açúcar a ser utilizada em cada batelada e quanto tempo a amostra de açúcar deve ficar lá pra garantir uma boa separação e gastar o mínimo de energia elétrica possível.

Entendeu? Vamos complicar, então.

Petróleo. Uma das operações unitárias mais importantes no processamento do petróleo é a destilação. A destilação é uma operação de separação que se baseia na diferença de pontos de ebulição dos componentes da mistura. De modo geral, o que acontece é o que está descrito nessa figura aí embaixo.
Belo esquema de destilação. Infelizmente está em espanhol.
O ouro líquido
O petróleo cru é aquecido na fornalha e entra na torre de destilação. O gás de petróleo é o componente de menor peso molecular e menor ponto de ebulição, de modo que sobe a torre mais rapidamente e pode ser retirado nos últimos pratos (topo) da torre. Os compostos a serem retirados em seguida podem ser observados no esquema.
Torre de destilação. Ela não é linda?
O fato é: parece simples, mas não é. A Família Buscapé quis nos iludir, mas a verdade é que cada poço de petróleo (e me refiro a poços que distam  poucos quilômetros uns dos outros) tem diferentes características. Alguns são mais ricos em compostos leves (apresentam cor mais esverdeada), outros são ricos em compostos pesados (são mais escuros). Essas características devem ser analisadas e levadas em consideração, pois vão influenciar nas propriedades do material - como densidade e viscosidade. Uma vez levando em conta essas e outras propriedades, é necessário determinar a vazão de petróleo que vai entrar na torre continuamente (o método contínuo é o mais utilizado atualmente), em que prato (ou fração da torre) vai ser alimentada essa vazão, qual será a vazão de vapor superaquecido que vai entrar na torre para permitir a movimentação das moléculas. E, caso tenha que projetar a torre, surgem mais perguntas: quantos pratos no total haverá na torre (na teoria e na prática, considerando-se a eficiência do processo), qual o diâmetro da torre, qual a altura da torre, qual o material da torre, qual o material dos pratos... Enfim, tudo isso considerando-se a segurança, o gasto energético e o maior rendimento possível. Ah, tem mais, quanto mais "pesado" o seu petróleo, menos rentável, pois os compostos leves são os de maior valor agregado. Logo, lá vai você ver qual a melhor forma de quebrar o composto grande em pequeno. Mas pra isso você tem que limpar o petróleo de compostos de enxofre através de alguma reação química, pois o enxofre, assim como alguns metais, envenenam os catalisadores das reações de craqueamento. Não esquece da multa, caso a indústria comece a emitir compostos poluentes acima do limite permitido - precisa ter sistema de limpeza de gases tóxicos e tratamento de efluentes líquidos.

Sacou?

O engenheiro químico foi feito pra indústria. Pra cuidar do meio ambiente, da segurança dos funcionários e da qualidade do produto. Pra aumentar o lucro da empresa e, com bastante trabalho e um pouco de sorte, diminuir o preço do produto final que compramos.

É ou não é mais importante do que você pensava?


Habitat natural do Engenheiro Químico.

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